Deitado na minha cama de hospital, alugada eternamente, oiço, de olhos fechados delirante, o médico que já vejo meu a falar com o padre enviado por alguém da minha família com o objectivo de me tirar as "ideias malucas" da cabeça.
Padre - A vida é o valor absoluto da humanidade. Católico ou não católico, crente ou ateu, todo o indivíduo tem direito à vida.
Médico - Queira desculpar-me por lhe dizer que está a cometer um erro de raciocínio. Precisamente: a vida é um direito. Mas em nada isso afecta a validade da vontade do meu doente. Direito não equivale a dever. Valor absoluto da humanidade: a vida? Talvez... mais que a liberdade? Até que ponto?
Padre - Jesus Cristo veio ao mundo sofrer por nós. Como pode falar de liberdade, da liberdade de querer perder a vida, renegando o maior legado que Deus nos deixou? A própria vida...
Médico - Jesus Cristo sofreu e morreu. O que você quer é que este homem aqui deitado encarne o sofrimento de Jesus Cristo eternamente. Que fique na cruz para sempre. Onde está a liberdade deste homem? Será que está retida nas mãos de Deus?
Padre - Deus decidirá o momento desse homem partir. Não queira fazer de Deus.
O padre saiu do quarto, sem falar sequer comigo. O seu objectivo era fazer uma lavagem ao cérebro do meu médico, impedindo-o eticamente de me fazer a vontade. O meu médico, o meu melhor amigo daquele momento, abeirou-se da minha cama. Não abri os olhos, não conseguia. Ele sabia-o bem. Pegou-me na mão, senti na sua uma convicção enorme e inabalável do que tinha a fazer.
Médico - Que se faça a tua vontade. Não tens que sofrer, não tenho que te fazer viver contra a tua vontade. Neste momento, não sou médico, mas teu amigo.
E, num movimento que significou a minha salvação, a fuga da dor, desligou a máquina, (ar)riscando a sua vida profissional, enfrentando o padrão da moral, perfeitamente consciente de que fizera a escolha certa: não para Deus, não para a lei, mas para mim.
5 comments:
gostei deste post...
sobre uma realide ilegal em
portugal, mas que de certa maneira
por vezes era o melhor a fazer...
ta giro :)
continua assim.. bj**
Contrariamente ao do aborto, em que tenho convicções mais ou menos seguras, este é um domínio onde me sinto sem certezas.
Gostei particularmente do argumento do confronto entre a vida e a liberdade. E fiquei ainda mais inseguro ;-)
Abraço.
Há dias num filme-documentário castelhano que recomendo, "O céu gira", dois agricultores de uma aldeia quase despovoada falavam da morte de forma simples, profunda e deslumbrante junto da campa de conterrâneos. Para eles morrer seria tão natural quanto viver. Mas que venha tarde a morte, acrescentavam, com humor.
A eutanásia nem devia discutir-se -é um direito básico de
todos nós. Não aceito uma lei que me impeça de partir quando entender fazê-lo...
ao contrário do ai meu deus, tenho as minhas dúvidas quanto ao aborto mas, em relação à eutanásia, não tenho qualquer dúvida: sou completamente a favor.
de acordo com o vm.
Abraço.
o aborto e a eutanásia foram, sao e sempre serao um assunto controverso..
eu comecei a ler o texto..mas como aquilo tava a começar a esigir mais de mim do que hoje tou preparada a dar nao o acabei de ler..mas mais tarde..talvez amanha voltarei para o ler e perceber..
o aborto sou a favor da liberalisação..mas a meu ver nao deve de ser totalmente gratuito..como ja disse cada um é responsavel pelas suas irresponsabilidades.e tem de assumir as consequencias das suas decisões..e por outro lado nao concordo com o que os politicos utilizem para levar as pessoas a um "sim"..nao tem nada haver com os direitos da mulher, mas sim com os direitos do casal ele é que decide, embora a mulher tenha um papel mais activo nesta decisao..mas vou parar de falar disto porque o post fala de eutanásia..
inda no ano passado fiz um trabalho sobre eutanásia e nao cheguei a conclusao nenhuma..
porque a vida é sinónimo de felicidade..se a pessoa nao é feliz, nao pode fazer por ser feliz..talvez seja melhor partir em busca de algo.(se houver algo).
mas mesmo assim nao sei..é uma pergunta complicada..
ups. para variar ja me estiquei a escrever..
desculpa..
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